(Um caso sobrenatural)
Numa noite chuvosa, enquanto o vento uivava pelas frestas da janela, Júlia aconchegava seu filho Emílio, de apenas cinco anos, em sua caminha. O menino, sempre sonhador, olhava fixamente para o teto quando, de repente, sussurrou:
– Mamãe… você sabia que eu tinha outra mãe antes?
Júlia estremeceu. Estava acostumada à imaginação fértil do filho, mas aquelas palavras carregavam algo mais… algo sombrio.
– Outra mãe? – perguntou, tentando manter o tom leve enquanto acariciava os cabelos do menino. – Como ela era?
Emílio fechou os olhos por um instante e, com a voz embargada, respondeu:
– Não era como tu. Ela não me amava tanto. Não gostava de mim… porque o papai me amava mais do que ela.
Um frio percorreu a espinha de Júlia. Havia uma verdade inquietante no olhar do filho. Ela respirou fundo.
– O que aconteceu com ela, meu amor?
O menino se encolheu, abraçando forte seu ursinho.
– Uma noite… ela ficou com muita raiva. Papai estava trabalhando e eu brincava sozinho. Ela disse que tudo ia ficar bem… e me levou ao rio. Eu chorei, disse que não queria, mas ela me segurou e… e me jogou na água. Eu não conseguia respirar… tentei sair… mas ela não deixou. Até que eu dormi…
Júlia, com os olhos marejados, tentou tranquilizá-lo:
– Foi só um pesadelo, querido. As mães não fazem mal aos seus filhos.
Mas Emílio encarou-a com lágrimas sinceras:
– Ela era má. E vem me procurar todas as noites. Me chama… mas eu não quero ir com ela. Contigo estou seguro, né?
Júlia o apertou em seus braços:
– Comigo, você está seguro, meu anjo. Se ela vier, diga que agora você tem a melhor mãe do mundo!
Naquela noite, enquanto Emílio dormia tranquilo, Júlia permaneceu acordada, com os olhos fixos na escuridão. Nunca acreditara em fantasmas ou vidas passadas, mas algo naquela história ecoava em seu íntimo.
Na manhã seguinte, Emílio acordou sorridente.
– Sonhei com ela, mamãe!
– Com a outra mãe? – perguntou Júlia, tensa.
– Sim. Mas desta vez, eu não tive medo. Disse que perdoava ela… Que já não me doía mais. Ela chorou… mas era diferente. Disse que agora podia descansar.
Júlia o abraçou, em silêncio. O menino parecia aliviado.
– Então ela se foi? – sussurrou ela.
– Sim, mamãe. Agora ela não vem mais.
Naquela noite, Júlia ficou com o filho até ele adormecer. Lá fora, o vento parecia carregar lamentos distantes, que logo se dissiparam na escuridão. Ela fechou os olhos, repetindo para si que tudo aquilo não passava de imaginação infantil…
Mas, no fundo, sabia que havia sido real.
Considerações Finais
Não são raros os casos em que crianças, jovens ou até adultos experimentam lapsos de memórias de vidas anteriores. Alguns espíritos necessitam de auxílio para recordar, enquanto outros têm essas lembranças de forma espontânea — um sinal de estágios evolutivos distintos.
Emílio, ainda muito pequeno, recordava de sua existência anterior. A “outra mãe” não era sua mãe biológica, mas uma madrasta, tomada pela inveja e pelo ciúme, que tirou sua vida em um ato covarde. Após desencarnar, essa alma passou por sofrimento nos planos inferiores até ser socorrida e buscar o perdão como forma de redenção.
Talvez Júlia, nesta nova vida, tenha sido justamente a mãe biológica de outrora — agora, reencontrando seu filho e finalmente podendo amá-lo como não pôde antes.
A reencarnação e o perdão são mistérios divinos que entrelaçam as almas ao longo do tempo. E, às vezes, é preciso apenas o coração puro de uma criança para ajudar uma alma perdida a encontrar o descanso eterno.