O nome da filha é Angélica. Está na adolescência, tento compreendê-la da melhor maneira possível. Afinal, sou separada e não quero criar atritos à toa. Ela sempre foi uma menina diferente — sensível, introspectiva e fascinada pelo obscuro.
Angélica tem um cabelo preto como breu, que desce até a cintura. Sua pele é tão branca que parece feita de porcelana, e os olhos, de um negro profundo, parecem esconder mistérios. Gosta de se vestir de preto, ouvir músicas góticas e caminhar à noite no parque que fica bem em frente ao nosso apartamento.
Eu nunca me preocupei muito com isso. O parque é bem policiado, iluminado, e dá pra ver tudo da minha janela. Era uma rotina: Angélica colocava seus fones, mergulhava na própria música e caminhava sob as árvores enquanto eu, do primeiro andar, a observava.
Mas naquela noite, algo mudou.
Fazia calor, e mesmo assim, uma névoa densa começou a se formar no meio do parque. Uma névoa estranha, que não vinha do chão, mas parecia nascer do ar, como um véu branco sendo tecido lentamente.
No meio dela, vi um homem alto, de traços indefinidos, aproximar-se da minha filha. Angélica tirou os fones, e por um instante, eles se beijaram. Juro que vi. Foi um beijo lento, envolto por aquela névoa, que parecia se mover como fumaça viva ao redor deles. Então, num piscar de olhos, a neblina se dissipou — e o homem desapareceu.
Angélica continuou andando, como se nada tivesse acontecido. Achei estranho, mas não quis me alarmar. Continuei observando por alguns minutos e, cansada, fui assistir TV. Acabei cochilando no sofá.
Quando acordei, eram quase duas da manhã. Ouvi a porta se abrir devagar. Era Angélica. Passou por mim sem dizer uma palavra e foi direto para o quarto. Dormiu o dia inteiro seguinte.
Desde então, ela não dorme mais à noite.
Angélica acorda apenas quando o sol se põe, e fica desperta até o amanhecer. Não vai mais à escola. Mal come durante o dia — mas percebi que as carnes da geladeira têm desaparecido rapidamente. Sempre à noite.
Perguntei sobre o rapaz do parque. Ela riu, baixinho, e respondeu:
— “Ah, mãe… ele é muito velho pra mim.”
Velho… mas seu olhar, ao dizer isso, não era de zombaria. Era um olhar distante, quase melancólico.
Ultimamente, as notícias da região têm me deixado inquieta: corpos encontrados no parque, sempre de madrugada, com os rostos pálidos e sem uma gota de sangue.
Eu tento me convencer de que é coincidência. Que tudo isso é apenas uma fase.
Mas hoje de manhã, quando entrei no quarto dela para abrir as cortinas, Angélica gritou como se o sol a queimasse.
E por um instante — só por um instante — juro que vi os olhos dela refletirem um brilho vermelho, como brasas acesas na escuridão.
Talvez seja mesmo “coisa de adolescente”.
Ou talvez… minha filha não seja mais a mesma desde aquela noite na névoa.



