Sai da minha casa, maldita ingrata! — bradou o pai de Amara, empurrando-a para fora da casa com uma mala surrada e algumas moedas atiradas a seus pés.
A jovem de dezesseis anos fitou-o com os olhos marejados. Sua madrasta, ao lado do homem, apenas cruzou os braços, satisfeita com a cena que ajudara a construir.
— Pai, por favor… — Amara tentou argumentar, protegendo o ventre ainda discreto sob o vestido simples.
— Cala essa boca! Você desonrou nossa família! — gritou ele, a face avermelhada pelo ódio. — Pegue suas coisas e nunca mais volte!
A porta se fechou com um estrondo, deixando Amara sozinha sob o céu cinzento da vila. Com passos trôpegos, buscou abrigo entre conhecidos, mas as portas se fechavam uma após a outra. Os olhares carregados de julgamento queimavam mais que o frio que cortava sua pele.
Sem ter para onde ir, vagou até que seus pés a levaram ao cemitério esquecido nos limites do vilarejo. Lá, encontrou refúgio em um mausoléu de pedra coberto por musgo e tempo. Encolhida em um canto, abraçou o próprio corpo, tentando proteger a vida que crescia dentro dela.
— Eu não vou te abandonar… — murmurou ao ventre, sua voz fraca e vacilante. — Vou encontrar um jeito…
Mas o frio não perdoava. A febre a consumia, e, entre o delírio e a vigília, notou pequenas luzes azuladas surgindo no ar. Elas dançavam ao seu redor, sussurrando palavras que ela não compreendia.
— Não temas… estamos aqui para ti…
Amara, tomada por uma estranha sensação de paz, ergueu-se cambaleante e seguiu as luzes. Elas a conduziram até a parte mais antiga do cemitério, onde túmulos esquecidos repousavam sob ervas daninhas.
Uma força invisível a fez ajoelhar-se, e suas mãos, como se movidas por outra vontade, começaram a cavar a terra úmida. Os dedos feriram-se nas pedras, mas ela continuou até encontrar algo sólido: uma urna de barro selada.
Com esforço, abriu-a, revelando moedas antigas de ouro e prata. Seus olhos arregalaram-se, incrédulos.
— Por quê…? — sussurrou, e uma das luzes pousou sobre seu ombro, respondendo com uma voz etérea:
— Foste a única a nos ver, a nos respeitar, a chorar por nós… Agora, nós te retribuímos.
Lágrimas rolaram pelo rosto de Amara enquanto as luzes se dissolviam no vento. Com aquele tesouro inesperado, ela deixou o cemitério antes do amanhecer e partiu em busca de um novo destino.
Os anos passaram. Amara construiu uma vida digna, deu à luz um menino forte a quem chamou Elias, e prosperou. Quando o pequeno completou seu primeiro ano, ela voltou à casa onde fora rejeitada, desta vez vestida com trajes finos e adornada com joias que brilhavam sob o sol.
Seu pai a recebeu com um sorriso falso, os olhos gananciosos pousando sobre as riquezas que ela ostentava.
— Filha, você voltou! — exclamou, tentando parecer afetuoso.
Sem hesitar, Amara estendeu um pergaminho diante dele.
— Não voltei para ficar — disse firme. — Comprei esta casa. Agora ela é minha. Você e sua esposa têm até o cair da noite para sair.
A expressão do homem se desfez.
— Como ousa? Eu sou seu pai! — vociferou.
— Você foi meu pai. Agora, sou apenas a dona desta casa. — Seus olhos eram gélidos como a noite em que ele a expulsara.
Sem mais palavras, virou-se e entrou, fechando a porta atrás de si. Da janela, observou enquanto ele e sua esposa saíam sob a chuva, carregando suas poucas posses.
Ao sentir um toque leve em seu ombro, Amara olhou para a vela acesa na mesa. A chama tremulou sem vento algum, como se lhe sussurrasse algo.
Ela sorriu, acariciando a cabeça do filho.
— Obrigada… Jamais os esquecerei.