Em uma antiga cidade costeira, envolta por brumas e rezas esquecidas, viveu um homem que a medicina rejeitou e o amor enlouqueceu. Chamavam-no apenas de O Doutor Louco, mas seu nome verdadeiro se perdeu com o tempo, enterrado junto aos horrores que protagonizou.
Diz-se que tudo começou quando ele conheceu uma jovem de beleza celestial, chamada Maria Elena, moça de olhos tristes e saúde frágil, que cantava nas janelas como quem tenta espantar a morte. Ela sofria de uma doença incurável, e o doutor, ao vê-la pela primeira vez, jurou aos céus e ao inferno que jamais a deixaria partir.
Mas a morte não faz promessas. Quando Maria se foi, ainda tão jovem, o doutor não aceitou. Construiu-lhe um túmulo de mármore branco, e todas as noites, sob o luar pálido, ele ia até lá, levando flores, poemas e sussurros de amor.
Até que numa noite silenciosa, ele não voltou. Nem para casa, nem para o túmulo.
Dizem que naquela madrugada, movido por uma obsessão que beirava o delírio, ele roubou o corpo de Maria Elena e o levou para sua morada. Trancado em sua velha casa de janelas fechadas, o doutor passou a viver com a morta como se ela ainda respirasse. Usou fios de cobre para unir seus ossos, preencheu os buracos da carne com gesso, e lhe pôs uma máscara feita de cera. Colocou olhos de vidro em seu rosto sem vida e uma peruca feita dos fios reais de seus cabelos, que ele havia guardado como relíquia.
Durante sete anos, vizinhos ouviam músicas suaves vindas da casa, e janelas que nunca se abriam. Alguns juram que viram o vulto de uma mulher dançando com o doutor à luz de velas.
O segredo, no entanto, não ficou enterrado para sempre. Um dia, uma criança entrou na casa ao buscar uma bola perdida e saiu gritando. O que viu lá dentro era tão horrendo que até hoje seu cabelo é branco como neve.
Chamaram a polícia. O corpo embalsamado, desfigurado e mutilado de Maria Elena foi encontrado deitado em uma cama de linho, com flores secas nos cabelos e um véu de noiva sobre a cabeça. Mas o mais grotesco foi o que os peritos descobriram depois — sinais claros de que o doutor mantinha relações carnais com o cadáver.
Preso e julgado, foi libertado por tecnicalidades legais. Nunca mais pôde clinicar, e ninguém jamais o viu sorrir. Viveu sozinho, afastado do mundo, até que em 1952, encontraram seu corpo sem vida, abraçado a uma boneca feita à imagem de Maria Elena. Uma nova noiva de cera, que ele mesmo moldara com mãos trêmulas e mente consumida.
Até hoje, os mais antigos alertam:
“O amor que não aceita o fim, vira maldição.”
E nas noites em que a lua está cheia, há quem diga que se ouve uma valsa triste vinda das ruínas daquela velha casa, e duas silhuetas dançando…
Um médico, e sua amada morta.